terça-feira, 23 de abril de 2013
E se as telas e pincéis da Itália fossem espelhos e colinas da Irlanda? Um bárbaro captura a beleza tanto quanto um Sanzio. Enquadramos quase toda a beleza da vida que nos toca (seria um impulso primitivo?), eis um dos males da métrica, uma onipresença na expressão, eis a compulsão por achar, ou dar alguma exatidão em todo o caos da disposição natural. Talvez precisemos de um mínimo de aritmética para reconhecer a vida. Ser naturalista e transpor ecossistemas e universos em arte, mostrar o gosto parcial e sutil percepção de uma cognição, intercambiar imagens, intercambiando ideias, pela geometria, ser engajado através de um objeto "quadrado". "Pensar é estar doente dos olhos" dizia Caeiro, será verdade? Quadrados e suas pontas limitantes e ao mesmo tempo desbravadoras, pontas que delinearam história e delineiam críticas. Uma vida de ensinamentos pelo quadrado. A "Educação pela pedra" do Sr. João Cabral é antes a "Educação pelo quadrado"! A fotografia, o livro, o pergaminho, a tela. Plantar árvores através de um monitor é viável? E cá estamos, a pós-modernidade é tão "natural" para quem tem todo o aparato de carbono e silício, um contraponto ou um só ponto?
segunda-feira, 22 de abril de 2013
Arrebol de outono
Acreditando em acasos e ocasos ela se penteia e se pinta, usa fitas e borda a noite, talvez ela não saiba que a ilusão óptica é mais do que física, é toda a sua significância em uma mente que se projeta. Espera por um animal qualquer, deixa o fogo aceso e talvez faça alguma bebida quente, para não se sentir sozinha; pela janela folhas amassadas e secas, alaranjadas como o ocaso pelo qual espera e se pinta, a mesma cor, e as folhas têm os mesmos tons, e assim a chama, e assim sua polidez de cada dia. A física não lhe permite mais do que a enternecedora cor e calor de cada raio de luz, talvez seja melhor contratar pessoas que instalem cortinas, ela não é capaz. Anoitecendo a cortina se resolve, não precisa existir, e ela só pensa na manhã, cujo arrebol já não é capaz de a esquentar.
segunda-feira, 15 de abril de 2013
Não tenho a pretensão de ser científica, mas quero tratar da problemática do suicídio. Talvez seja antes uma questão moral e de delimitação da liberdade, que para mim se mescla à autonomia que é íntima à questão de se racionalizar sobre desejos. Seguir os impulsos não é ser livre, ponderar sobre eles e escolher um caminho sim. A racionalidade pauta a liberdade, pois. A angústia e a melancolia da vida, segundo um certo senhor estrábico do século passado, é consequência dessa ponderação livre e além disso, uma atitude pró-construtiva do ser humano, angústia vem da liberdade junto a suas implicações e responsabilidades. Eis uma introdução.
Gostaria antes do cunho literário ter atenção filosófica, a questão do suicídio tem perpassado meus estudos em psiquiatria e como emergência médica que é qualificada, tenho me atentado para a possibilidade de recusar a possibilidade patológica da questão ou talvez flexibilizar o patológico para o "naturalmente-humano" (demasiado humano, talvez). Tenho sido doutrinada para reconhecer o caráter de Transtornos Depressivos Maiores em pacientes e julgar seu risco de suicídio, internação seria um bom procedimento para tais pessoas, psicoterapia ativa e aviso prévio de familiares outra boa conduta. Bravo aos médicos, dai-nos o comprimido de cada dia! Entretanto, quando se analisa do ponto de vista moral, devo eu, agir a ponto de interferir na autonomia alheia? Acredito que tanto a patologia psiquiátrica da depressão, a qual possui um subtipo denominado melancólico, quanto o suicídio em si são consequências naturais, lineares e saudáveis do uso devido da liberdade.
Escolhas trazem angústia, angústia pode gerar quadros progressivos de tristeza, entretanto, não devo ter cortes ou intromissões no direito de escolha ponta pé para o desenrolar da sequência, não admite-se intromissões na autonomia de escolha, nesse ponto estão todos em pleno acordo, a constituição endossa. Admite-se, pois, intromissão sobre o que se fazer das consequências da liberdade? Ter garantido o direito ao suicídio deveria ser um mérito de nossas questões filosóficas de cada dia. O niilismo estaria correndo o risco de se extinguir por civilidade e ser taxado de transtorno patológico, como pude constatar em certo compêndio psiquiátrico? A ausência de sentido na vida é uma forma de observar e compreender a vida, não acredito que seja uma visão negativista ou realista, mas uma visão, de um panorama específico, assim como a visão de que a vida é bela, é regida por um deus ou é só uma ilusão sináptica.
Nossa cultura pós-moderna distorce a noção de humanidade, saúde, beleza, eis o ápice apolínico. O dionisíaco de cada um está em nossos impulsos cada vez mais violentados pelos recalques da etiqueta social. O freudiano do gozo tanto pela vida, quanto pela morte que nos é intrínseco está privado em regras de bons costumes e rótulos em que se escreve "patológico". A vida é patológica, o ar é patológico e nos oxida! Respeitar o transtorno que cada um exige, compra, mimetiza para si é preciso, o respeito em seu conceito se perdeu, a conveniência respeitosa prepondera. O fato se encerra em que nem a psicanálise, nem a medicina salvam a sociedade de sua mazela moral a que todos se submetem e se despersonificam no decurso. Movimentos por autonomia seriam mais dignos do que movimentos remediadores por legalizações de assuntos discordantes, a polêmica existe em detrimento do desrespeito à liberdade de viver ou morrer que cada indivíduo carrega consigo, inalienável autonomia da existência.
Assinar:
Postagens (Atom)